terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Interpretando monstros de outros armários VI


Andando pelas ruas da cidade que moro em tempos de festa - existe uma grandiosa festa neste período relatado, que consome basicamente o mês inteiro - encontro um amigo de longa data - alguns diriam um amigo pessoal, quando me dizem isto fico pensando o que seria um amigo impessoal (risos) - de certo é que encontrei este amigo indo para a universidade desenvolver meus atributos profissionais. Parei, conversei um pouco, e este me sugeriu que após o término de minha aula poderíamos tomar um chopp para jogar uma prosa fora. Aceitei prontamente, e como de costume ministrei minha aula e ao findar-se, fui ao encontro de meu amigo, que aqui chamarei de Gio.
Liguei para ele e marcamos para tomar um choppinho - (risos) porque quando bebemos (ou vamos beber) um pouco mais da conta tendemos a minimizar nossa ação temerária, mais ou menos do nível, um churrasquinho ou uma cervejinha, me divirto com isto, pois me parece (não tenho certeza, certo?!) que dimensões emocionais autorreguladoras e sociais de controle precisam ser cerceadas ou coagidas ora por nós, ora por outros, algo como do tipo: preciso me distanciar do sentimento de culpa que possa vir a habitar em meu corpo após tal “pequena quantidade de chopp” ou me aproximar da sociedade de controle e das representações sociais criadas pelos os outros para me vigiar e julgar e posteriormente me punir intrepidamente.
De fato é, que sentamos em um bar para aquele “chopinhho” e Gio me perguntou objetivamente como é a cidade durante os demais meses que não existe a festa; e como funciona a dinâmica de controle e permissões sociais. Afinal estava perplexo com as situações que presenciou durante a festa, desde o centro da cidade até o núcleo central desta festa. Respondi a partir da minha visão de sociedade - obviamente - ou seja, subjetiva e interpretativamente, portanto sujeita a outras perspectivas valorativas e categoriais. Confira a transcrição da prosa, a seguir:
Gio: fala “Laranja” - tenho este apelido em função do meu sobrenome LaranGeira - quanto tempo não nos falamos? Saudade de nossas prosas de tempos longínquos, daquela época que não tínhamos tantas responsabilidades formais. Tenho observado aqui na festa a dinâmica de seu desenvolvimento e fico a pensar: como funciona a dinâmica de controle e permissões sociais quando não estão em festas? Laranja: por quais razões pergunta isto Gio? Gio: pelo fato de ter observado grande parcimônia de toda a população em ações que certamente fogem da ordem social e qualquer lugar do planeta, inclusive aqui. Laranja: por exemplo? Gio: observei pessoas dirigindo embriagadas em frente ao núcleo central da festa, local em que existiam inúmeros policiais. Sujeitos locais bebendo e andando pela rua tranquilamente, sem nenhum constrangimento; incursões íntimas bastante avançadas frente a crianças e adolescentes. Laranja: então, durante o ano muitas coisas observadas por você não são toleradas em função das leis e seu exercício, outras não são toleradas por motivos de representação social. Imagina eu andando pela rua principal da cidade às 14h da tarde bebendo um chopp, me parece que seria alvo de diversas perspectivas valorativas negativas.
Gio: quanta hipocrisia “Laranja”, quer dizer que em tempos de festa tudo ou quase tudo é permitido? Laranja: mas “Gio”, isto é uma situação corriqueira em todas as manifestações sociais coletivas, alguma coisa no sentido de permissão evidenciada no inconsciente coletivo. Gio: é verdade meu caro, percebo isto em outras circunstancias, tais como: copa do mundo, saída de um jogo de futebol, olimpíadas e até mesmo em militâncias políticas por votos. Posso assegurar com certeza que vivemos em uma falácia social em que os sujeitos pactuam inconscientemente para fugir das mazelas sociais, das enfermidades da vida, como se isto fosse possível. Laranja: concordo, e sinalizo ainda que isto é um engodo aos sujeitos que não “curtem” pensar de maneira critica as condições sociais de vivência e que perpetuam aquele “isto é normal”; “sempre foi assim”; “depois passa”; “o tempo cura” e algo mais nesta esteira. Parece que nos oferecem algumas migalhas de possibilidades e aceitamos de maneira tranquila e reproduzimos isto sistematicamente. Os trotes universitários entre outros, permitem tais compreensões, afinal, queremos reproduzir nos outros aquilo que sofremos ou passamos. Gio: precisamos romper com esta lógica meu amigo, ainda que possa custar muito a nós e aos nossos. Necessitamos ter a consciência de lutar e continuar a lutar contra as iniquidades sociais. E às vezes apenas debater com os outros já é um grande caminho percorrido, ainda que isto seja rotulado pejorativamente como um discurso humanista ou algo do gênero. Laranja: com certeza, sigamos em frente buscando melhores condições de vida a todos neste planeta. Ainda que uns não mereçam, mas não sou eu que vou julgar sujeitos que espalham a subserviência e a manutenção das castas. Agora, provocar a curiosidade e promover condições de transformação desta realidade empírica, certamente, o farei. Com todas as minhas forças. Gio: Boa, estamos juntos nesta lida, para sempre.
Assim regado a um “chopinho” - aquele politicamente correto, portanto permitido - falamos muito sobre vários assuntos, em que a temática sempre voltava a estes posicionamentos. Muito interessante é que fazia muito tempo que eu e Gio não nos falamos, muito menos dialogávamos sobre quaisquer coisas. E, fazíamos muito isto no ensino médio, ou seja, tínhamos estes tipos de pensamentos desde muito tempo, e hoje posso dizer, fazia parte de nós pensarmos as coisas que nos cercam.
Obrigado Gio por permitir tais considerações de ressignificação e de visualização de outras possibilidades interpretativas da vida. Da vida somos e a fazemos diariamente! Abraço.
Ia esquecendo sobre a dinâmica de controle e permissões sociais. Estas continuam, e nós continuamos a pensar e discutir criticamente suas falcatruas morais e éticas. Assim seja.

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