Andando pelas
ruas da cidade que moro em tempos de festa - existe uma grandiosa festa neste
período relatado, que consome basicamente o mês inteiro - encontro um amigo de
longa data - alguns diriam um amigo pessoal, quando me dizem isto fico pensando
o que seria um amigo impessoal (risos) - de certo é que encontrei este amigo
indo para a universidade desenvolver meus atributos profissionais. Parei,
conversei um pouco, e este me sugeriu que após o término de minha aula
poderíamos tomar um chopp para jogar uma prosa fora. Aceitei prontamente, e
como de costume ministrei minha aula e ao findar-se, fui ao encontro de meu
amigo, que aqui chamarei de Gio.
Liguei para
ele e marcamos para tomar um choppinho - (risos) porque quando bebemos (ou
vamos beber) um pouco mais da conta tendemos a minimizar nossa ação temerária,
mais ou menos do nível, um churrasquinho ou uma cervejinha, me divirto com
isto, pois me parece (não tenho certeza, certo?!) que dimensões emocionais
autorreguladoras e sociais de controle precisam ser cerceadas ou coagidas ora
por nós, ora por outros, algo como do tipo: preciso me distanciar do sentimento
de culpa que possa vir a habitar em meu corpo após tal “pequena quantidade de
chopp” ou me aproximar da sociedade de controle e das representações sociais
criadas pelos os outros para me vigiar e julgar e posteriormente me punir
intrepidamente.
De fato é, que
sentamos em um bar para aquele “chopinhho” e Gio me perguntou objetivamente
como é a cidade durante os demais meses que não existe a festa; e como funciona
a dinâmica de controle e permissões sociais. Afinal estava perplexo com as
situações que presenciou durante a festa, desde o centro da cidade até o núcleo
central desta festa. Respondi a partir da minha visão de sociedade - obviamente
- ou seja, subjetiva e interpretativamente, portanto sujeita a outras
perspectivas valorativas e categoriais. Confira a transcrição da prosa, a
seguir:
Gio: fala “Laranja” - tenho este apelido
em função do meu sobrenome LaranGeira - quanto tempo não nos falamos? Saudade
de nossas prosas de tempos longínquos, daquela época que não tínhamos tantas
responsabilidades formais. Tenho observado aqui na festa a dinâmica de seu
desenvolvimento e fico a pensar: como funciona a dinâmica de controle e
permissões sociais quando não estão em festas? Laranja: por quais
razões pergunta isto Gio? Gio: pelo fato de ter observado grande
parcimônia de toda a população em ações que certamente fogem da ordem social e
qualquer lugar do planeta, inclusive aqui. Laranja: por exemplo? Gio:
observei pessoas dirigindo embriagadas em frente ao núcleo central da festa,
local em que existiam inúmeros policiais. Sujeitos locais bebendo e andando
pela rua tranquilamente, sem nenhum constrangimento; incursões íntimas bastante
avançadas frente a crianças e adolescentes. Laranja: então,
durante o ano muitas coisas observadas por você não são toleradas em função das
leis e seu exercício, outras não são toleradas por motivos de representação
social. Imagina eu andando pela rua principal da cidade às 14h da tarde bebendo
um chopp, me parece que seria alvo de diversas perspectivas valorativas
negativas.
Gio: quanta hipocrisia “Laranja”, quer
dizer que em tempos de festa tudo ou quase tudo é permitido? Laranja:
mas “Gio”, isto é uma situação corriqueira em todas as manifestações sociais
coletivas, alguma coisa no sentido de permissão evidenciada no inconsciente
coletivo. Gio: é verdade meu caro, percebo isto em outras
circunstancias, tais como: copa do mundo, saída de um jogo de futebol,
olimpíadas e até mesmo em militâncias políticas por votos. Posso assegurar com
certeza que vivemos em uma falácia social em que os sujeitos pactuam
inconscientemente para fugir das mazelas sociais, das enfermidades da vida,
como se isto fosse possível. Laranja: concordo, e sinalizo ainda
que isto é um engodo aos sujeitos que não “curtem” pensar de maneira critica as
condições sociais de vivência e que perpetuam aquele “isto é normal”; “sempre
foi assim”; “depois passa”; “o tempo cura” e algo mais nesta esteira. Parece
que nos oferecem algumas migalhas de possibilidades e aceitamos de maneira
tranquila e reproduzimos isto sistematicamente. Os trotes universitários entre
outros, permitem tais compreensões, afinal, queremos reproduzir nos outros
aquilo que sofremos ou passamos. Gio: precisamos romper com esta
lógica meu amigo, ainda que possa custar muito a nós e aos nossos. Necessitamos
ter a consciência de lutar e continuar a lutar contra as iniquidades sociais. E
às vezes apenas debater com os outros já é um grande caminho percorrido, ainda
que isto seja rotulado pejorativamente como um discurso humanista ou algo do
gênero. Laranja: com certeza, sigamos em frente buscando melhores
condições de vida a todos neste planeta. Ainda que uns não mereçam, mas não sou
eu que vou julgar sujeitos que espalham a subserviência e a manutenção das
castas. Agora, provocar a curiosidade e promover condições de transformação
desta realidade empírica, certamente, o farei. Com todas as minhas forças. Gio:
Boa, estamos juntos nesta lida, para sempre.
Assim regado a
um “chopinho” - aquele politicamente correto, portanto permitido - falamos
muito sobre vários assuntos, em que a temática sempre voltava a estes
posicionamentos. Muito interessante é que fazia muito tempo que eu e Gio não
nos falamos, muito menos dialogávamos sobre quaisquer coisas. E, fazíamos muito
isto no ensino médio, ou seja, tínhamos estes tipos de pensamentos desde muito
tempo, e hoje posso dizer, fazia parte de nós pensarmos as coisas que nos
cercam.
Obrigado Gio
por permitir tais considerações de ressignificação e de visualização de outras
possibilidades interpretativas da vida. Da vida somos e a fazemos diariamente!
Abraço.
Ia esquecendo
sobre a dinâmica de controle e permissões sociais. Estas continuam, e nós
continuamos a pensar e discutir criticamente suas falcatruas morais e éticas.
Assim seja.
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